29 agosto 2012

Bailar de meus anjos

       
Era a manhã gelada de um domingo de junho. Depois de muito insistir e choramingar mamãe se rendeu, nos vestiu com roupas quentes e nos deixou ir, desde que tomássemos cuidado e não nos demorássemos. Assim, em rumo ao parquinho da esquina fomos nós sozinhas! 

Pela primeira vez!

A neblina nos impedia de ver o final da rua que, para nós, ainda menininhas, parecia imensa. Eu segurei na mão dela e ela reclamou do tempo frio, como sempre, eu ri. Afinal, era meu preferido. Andamos ao lado do “passeio”, Cecília ainda tinha medo de ficar sozinha e se perder. Se perder na rua da nossa casa? Quanta bobeira!
Ela começou a se cansar e, eu, impaciente, pedi que ela se apressasse senão a deixaria para trás. 
"Mas o caminho é muito longo!" ela reclamou naquela voz baixinha. Mesmo assim, amedrontada, correu até mim em poucos segundos. 
Finalmente conseguimos alcançar o parque. Areia suja e molhada e brinquedos velhos e quebrados. Mas, naquele momento, para nós duas, isso não importava. Nada importava. Era apenas eu, ela e o primeiro gostinho de liberdade. 
Foram tempos agradáveis aqueles... Sem preocupações, sem brigas, sem escola, sem doenças e sem responsabilidade... Só nós, a sós.
Disputamos o único balanço e, mesmo tendo ganhado, a deixei ir primeiro, só pra rir das caretas que ela fazia quando eu empurrava muito forte. Deveria ter ficado naquele momento para sempre. O vento batendo no rosto dela, os cabelos curtos e loiros bagunçados, os lábios roxos de frio abertos em um enorme sorriso de dentes pequeninos. 
É assim que eu me lembro dela, do jeito que ficava enquanto eu a balançava. Dos gritos de alegria quando a altura era máxima, dos "será que se eu pular agora consigo voar?" cobertos com seu riso solto.
Foi a ultima vez que a vi rir tão empolgada. Depois daquele dia, nunca mais foi a mesma coisa... Sonhávamos com dias e dias naquele parquinho. Pretendiamos ser melhores amigas pra sempre e quando crescessemos, seriamos fadas que salvariam o mundo de todos os males...
Aposto que Cecilia seria uma fadinha linda. Graciosa. Mas não houve a chance de testar. Minha pequena e medrosa Cecília não precisou mais do balanço... Se cansou de esperar até crescer e criou asas cedo demais...


Texto escrito por mim em 2010 e editado hoje.

2 comentários:

  1. Juliana,

    achei lindo o seu texto, curto e muito suave para falar da perda de alguém, se lê sorrindo e no final vem uma lágrima aos olhos.
    Para mim, seu leitor, você já é escritora! Estou esperando ansioso o próximo texto!

    Henrique Zech

    ResponderExcluir

Hey, bem vindo (a)! Obrigada por passar por aqui. Fique a vontade para deixar sua opinião, a caixa de comentários é logo ai embaixo e ela não morde... Eu acho...